quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Fotografia e vanguardas

"Em outras palavras: o valor único da obra de arte “autêntica” tem sempre um fundamento teológico, por mais remoto que seja: ele pode ser reconhecido, como ritual secularizado, mesmo nas formas mais profanas do culto do Belo. Essas formas profanas do culto do Belo, surgidas na Renascença e vigentes durante três séculos, deixaram manifesto esse fundamento quando sofreram seu primeiro abalo grave. Com efeito, quando o advento da primeira técnica de reprodução verdadeiramente revolucionária – a fotografia, contemporânea do início do socialismo – levou a arte a pressentir a proximidade de uma crise, que só fez aprofundar-se nos cem anos seguintes, ela reagiu ao perigo iminente com a doutrina da arte pela arte, que é no fundo uma teologia da arte. Dela resultou uma teologia negativa da arte, sob a forma de uma arte pura, que não rejeita apenas toda a função social, mas também qualquer determinação objetiva. (Na literatura, foi Mallarmé o primeiro a alcançar esse estágio). É indispensável levar em conta essas relações em um estudo que se propõe estudar a arte na era de sua reprodutibilidade técnica. Porque elas preparam o caminho para a descoberta decisiva: com a reprodutibilidade técnica, a obra de arte se emancipa, pela primeira vez na história, de sua existência parasitária, destacando-se do ritual. A obra de arte reproduzida é cada vez mais a reprodução de uma obra de arte criada para ser reproduzida. A chapa fotográfica, por exemplo, permite uma grande variedade de cópias; a questão da autenticidade das cópias não tem nenhum sentido. Mas, no momento que o critério da autenticidade deixa de aplicar-se à reprodução artística, toda a função social da arte se transforma. Em vez de fundar-se no ritual, ela começa a fundar-se em outra práxis: a política."
A fotografia, ao inaugurar a era da reprodução mecânica das obras artísticas, suscitou uma infinidade de problemas estéticos e materiais que influenciaram as vanguardas artísticas do século XX.

Perseguir a verossimilhança não parecia mais fazer sentido, e vários movimentos passaram a refletir sobre a natureza e o realismo da imagem pictórica. Liberada pela fotografia da função de apreender objetivamente a realidade, a pintura passou a investigar nas formas, cores e composições - olhares e intervenções. É o que fazem, de modos diversos, Impressionismo, Pós-Impressionismo, Fauvismo, Expressionismo, e o Cubismo.

Duchamp, dá seu testemunho a respeito:
"Com a fotografia produzindo uma coisa muito correta, do ponto de vista do desenho, o artista que quisesse fazer outra coisa disse a si próprio: 'É muito simples, vou deformar o máximo que puder e assim estarei completamente livre de toda a representação fotográfica.' Isto é muito claro em todos esses artistas, sejam os fauves, os cubistas e mesmo os dadás ou os surrealistas."
CABANNE, Pierre. Marcel Duchamp: Engenheiro do tempo Perdido", Série Debates - Arte, Ed. Perspectiva, São Paulo, 1997 , p.158-9

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