quinta-feira, 25 de outubro de 2007

4. Cinema



Cinema: ator, máquina, massas:
No cinema o valor artístico da representação do ator se dá por meio de uma equipe de especialistas através da máquina, de dispositivos ópticos e técnicos que permitem a filmagem, montagem e manipulação das cenas.
Cinema: uma criação da coletividade a serviço do poder
Seu valor de exposição é posto à serviço da política e não das massas, sendo voltado para o culto do astro, a alienação do espectador, apesar do potencial revolucionário deste veículo.






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Benjamin mostra que na busca em atribuir ao cinema a dignidade de arte, alguns teóricos introduzem em seus estudos elementos ligados ao culto, ao sagrado ao sobrenatural. Para Werfel, por exemplo, o sentido do cinema estaria

"(...) na sua faculdade característica de exprimir , por meios naturais e com uma incomparavel força de persuasão, a dimensào do fantástico, do miraculoso e do sobrenatural."
Para Benjamin esta abordagem estaria equivocada: o fato determinante para avaliar sua natureza artística é que tanto em sua produção quanto em sua reprodução, a técnica é inseparável:
“Nas obras cinematográficas, a reprodutibilidade técnica do produto não é, como no caso da literatura ou da pintura, uma condição externa para sua difusão maciça. A reprodutibilidade técnica do filme tem seu fundamento imediato na técnica de sua produção. Esta não apenas permite, da forma mais imediata, a difusão em massa da obra cinematográfica, como a torna obrigatória. A difusão se torna obrigatória, porque a produção de um filme é tão cara que um consumidor que poderia, por exemplo, pagar um quadro, não pode mais pagar um filme. O filme é uma criação da coletividade”
Segundo Benjamin, o que define o cinema é o seu caráter coletivo; o filme é criado coletivamente e para a coletividade, respondendo aos anseios perceptivos do homem moderno, do homem-massa. O cinema é para Benjamin o produto mais característico da cultura de massas.

É a partir das considerações a respeito da reprodutibilidade técnica que Benjamin parte da comparação entre fotografia e filme para repensar o caráter artístico da produção cinematográfica:
Fotografar um quadro é um modo de reprodução; fotografar num estúdio um acontecimento fictício é outro. No primeiro caso, o objeto reproduzido é uma obra de arte, e a reprodução não o é. Pois o desempenho do fotógrafo manejando sua objetiva tem tão pouco a ver com a arte como o de um maestro regendo uma orquestra sinfônica: na melhor das hipóteses, é um desempenho artístico. O mesmo não ocorre no caso de um estúdio cinematográfico. O objeto reproduzido não é mais uma obra de arte, e a reprodução não o é tampouco, como no caso anterior. Na melhor das hipóteses, a obra de arte surge através da montagem, na qual cada fragmento é a reprodução de um acontecimento que nem constitui em si uma obra de arte, nem engendra uma obra de arte, ao ser filmado”.
Contrapondo as características do cinema às do teatro, Benjamin torna mais evidente o grande distanciamento entre estas duas linguagens e mostra onde estão os aspectos não-artísticos do filme: na forma peculiar com que o ator cinematográfico representa seu papel, bastante distinta do ator de teatro. O teatro torna mais pessoal o contato direto com os atores e consequentemente com as personagens havendo uma contemplação efetiva do público. O ator de teatro se encontra diante de um público, enquanto que o ator cinematográfico se apresenta diante de um grupo de especialistas (diretor, produtor, técnicos, etc.) que possui o direito de intervir, como na execução de um teste, num desempenho esportivo. As cenas são filmadas variadas vezes, sob formas diferentes, das quais uma será escolhida na edição em detrimento de outras. Mas trata-se de um teste diferenciado do que ocorre em outras esferas (profissional, esportiva), pois o ator cinematográfico não está diante do público mas sim de um aparelho (a câmera) e o diretor ocupa um espaço semelhante a de um examinador em um teste profissional. O ator de cinema sente-se, segundo Pirandello, no exílio, ausentado do palco e destituído de qualquer relação e experiência original com o público.

Ator de cinema: representa para a máquina, tal como o operário no capitalismo, fato que faz com que as massas se identifiquem com ele e com o filme, tal como ocorreu com Chaplin. A diferença é que enquanto o operário se aliena de sua dignidade perante a máquina, o ator conserva sua dignidade diante do aparelho e coloca a máquina a favor de seu triunfo pessoal.

Ator de teatro: representa para o público
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Ator de cinema: tal como o operário da linha de montagem, sua atuação é fragmentada em sequências que são filmadas numa ordem não linear, aleatória, que depende basicamente de fatores como cenografia, disponibilidade de outros atores, aluguel do estúdio,etc, não sendo capaz de observar seu trabalho na totalidade.
Ator de teatro: representa um papel integralmente.
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Ator de cinema: O ator de cinema não representa nenhum papel, representa unicamente a si mesmo. Para os entendidos de cinema, "os maiores efeitos são alcançados quando os atores representam o menos possível". Não precisa ser um bom ator e mostra a todos, através de seu exemplo, a possibilidade de fazer cinema. Por isto o cinema propicia o culto à personalidade: exalta a figura do campeão, do astro, do ditador.
Ator de teatro: representa um personagem.
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Ator de cinema: O ator se faz reproduzir através da câmera.
Ator de teatro: A atuação do ator é única, nova, original.
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Cinema: Idéia de algo que está se perfazendo.
Teatro: Valor de eternidade.
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Cinema: Prestígio na cultura de massas.
Teatro: Prestígio entre os gregos.
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Cinema: O filme, quando está sendo gravado, pode ser observado por diversos ângulos (melhores ou piores) a partir da máquina que o grava.
Teatro: destinado diretamente ao público, possui um.
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Cinema: Seu valor é o de exposição, com a consequente perda de aura que se encontra diretamente ligada ao aqui e agora do acontecimento, pois é uma arte técnica destinada ao coletivo, que sempre necessita de muita gente, visto que sua própria natureza configura-se dessa forma.
Teatro: Antigo valor de culto da arte tradicional.

No cinema o valor artístico
da representação do ator se dá por meio de dispositivos ópticos e técnicos que permitem a filmagem, montagem e manipulação das cenas.

Daí a necessidade da introdução do chamando culto da estrela de cinema, como forma de(tentar) conservar a magia da personalidade do ator, ao mesmo tempo que provoca o abandono da individualidade do espectador.

Benjamin identifica, também um problema na visualização do filme pelo público, defendendo que os nossos olhos estavam ainda demasiado virgens para receber imagens em movimento – O cinema apresenta uma imagem após a outra de tal maneira que o espectador vê e ouve só o que dele é visível e audível, não tendo que fazer mais do que simples associações mentais.

Há ainda a considerar, neste ponto, uma pequena referência à escrita também ela reveladora das metamorfoses da recepção da arte na era da sua reprodutibilidade técnica. Aqui é referido o tema da democratização da imprensa escrita enquanto formadora de leitores que são ou podem ser simultaneamente autores, assumindo, desta forma a literatura, o caráter de um bem – comum, objeto de massificação e consumo, apropriavel e acessível a todos.


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